Conto - O Presente
Sinopse
Um presente sempre
deixa um sorriso no rosto de quem o recebe, ainda mais quando foi ofertado
por aquela pessoa especial. Mas justamente no dia em que deveria estar de posse
desse presente, ele sumiu. E agora?
************************************************************
Vanda e Maciel se conheciam desde a
infância. Moravam na mesma rua em um bairro afastado da pequena cidade
interiorana em um tempo no qual as crianças brincavam livremente sem
preocupações.
Aquela amizade com o passar dos anos
transformou-se em uma paixonite juvenil. Começaram então um namoro escondido
por medo do pai da jovem. Maciel munido da pouca coragem que tinha foi em uma
noite qualquer pedir ao pai de Vanda permissão para cortejá-la.
Enquanto aguardava a decisão do homem,
Maciel tremia cada vez que seu olhar esbarrava na espingarda de estimação de
seu futuro sogro. Para seu alívio a resposta foi favorável, entretanto houve
condições e um vigia estava presente na hora do galanteio.
Três anos passaram e enfim casaram com
as bênçãos de Deus. No primeiro ano de casada Vanda engravidou e para alegria
de todos, era um menino. Maciel Amadeu Filho. Quando o pequeno completou dois
anos a mulher se viu grávida novamente, outro menino. Chamaria José Antônio, os
nomes do pai e do sogro. Passados cinco anos ela novamente engravidou. Uma
menina estava a caminho, a princesa da casa.
Laura nasceu em uma noite de terça-feira
chuvosa, prematura ficou oito dias na incubadora. O nome foi escolhido por
Maciel. Após dez dias todos foram para casa. Os parentes fizeram questão de
conhecer a pequena e levavam lembranças e presentes.
Os anos passaram, as crianças cresciam e
mostravam suas diferenças. Os garotos já pensavam em beijar as meninas e afastar
qualquer um que pensasse em se aproximar de sua irmãzinha. Laura também pensava
e ao contrário do que muitos pensavam, as garotas eram quem ocupavam seus
pensamentos.
O jeito delicado de ser, o doce perfume
que exalava de suas peles, o abraço confortável, a voz melodiosa e as torneadas
pernas. Ah, as pernas. E quando elas as cruzavam... Era o charme natural.
Enquanto seus irmãos mantinham os rapazes afastados, ela ia atrás das garotas e
nessas idas ela conheceu A Garota.
Estavam em uma excursão
por um museu com a turma do Colégio quando Laura distraiu-se olhando um quadro
e ao fazer menção de acelerar o passo esbarrou-se em uma morena vestida em uma
calça de couro e blusa ambos na cor negra. Seu coração errou uma batida.
-Me desculpe. __ pediu
ajudando a arrumar os livros dela que havia derrubado.
-Tudo bem. Também não
olhei para onde andava.
-Aqui. Tudo arrumado.
Quando a morena pegou os
livros suas mãos se tocaram e os olhos se encontraram. Depois de alguns
segundos o contato visual foi quebrado com uma despedida. Laura voltou para
junto de seus colegas embora vez ou outra procurasse a jovem. Quando saiam do
passeio informativo já havia desistido dela e assustou-se ao sentir uma mão em
seu ombro.
-Acho que você deixou isso
cair.
A morena entregou-lhe uma
pequena agenda e afastou-se. Ao abri-la tinha um número de telefone. Sorriu
pela primeira vez no dia. O caminho para casa foi agradável. Ainda naquela
noite discou de seu celular para o número e aquela voz atendeu seu chamado.
Conversaram sobre gostos,
filmes, filosofia, história e tudo mais que pudesse as segurar na linha. E
assim foi durante quase um mês, todas as noites até que marcaram um encontro.
Chegado o dia, Laura parecia uma pilha de nervos decidindo chegar mais cedo no
local, um quiosque a beira-mar.
Olhava a imensidão do mar
quando ouviu a voz com a qual tanto sonhara. Era ela. Cumprimentaram-se e
passaram a tarde trocando confidências. Quando se gosta do que faz as horas
passam rápido e assim foi com esse casal. Quando deram por si a noite já havia
chegado junto com as estrelas. Despediam-se e ao trocar os dois beijinhos um
cálculo errado resultou em um selinho. Ambas se olharam e inevitavelmente os
olhos miraram os lábios, os rostos se aproximaram e o primeiro beijo aconteceu.
Depois desse vieram
outros. Laura quase não dormia tamanha euforia. Outros encontros ocorreram e em
um deles um pedido especial. Laura foi surpreendida com um pedido de namoro
feito de forma tão romântica que não passava por sua cabeça recusar. Passearam
como casal recém-formado que era.
No dia da comemoração
de primeiro mês de namoro houve um almoço em família e Laura era obrigada a
estar naquele já que era aniversário de sua mãe e ela convidou sua amada para
acompanha-la. A morena foi apresentada a todos e Maciel Júnior fez uma piada a
respeito da origem do nome da moça que lhe rendeu um puxão de orelha por parte
de sua mãe.
-Tudo bem, dona Vanda. Eu
sei que Vladiscênia não é um nome comum. __ a morena disse banalizando a
tentativa de piada de seu cunhado.
Aproveitando uma distração
da família, o casal saiu e foram para sua comemoração particular. Enquanto
passavam em frente a uma vitrine quando uma calça jeans com algumas correntes metálicas
e rasgos chamaram a atenção de Laura. Notando o brilho naquele olhar em direção
a peça de roupa, Vladiscênia encontrou o presente perfeito. Há três anos, dois
meses e dez dias.
E justamente no dia de sua namorada não
conseguia encontrar a roupa. Laura descia as escadas do quarto como se
estivesse correndo contra o tempo em busca de sua mãe. Encontrou-a em frente à
TV, sentada em sua poltrona assistindo sua novela mexicana preferida Tormentas
de Uma Paixão.
-Mãe, a senhora viu minha calça?
-Você tem treze calças. Qual delas? __ perguntou
sem olhar a filha.
-A que mais uso.
-Aquela calça jeans de menino?
-Sim, mãe. __ela sabia que sua mãe
sempre detestou a calça.
-Já estava muito velha, filha. Cheia de
rasgos, descascando, a cor já desbotada.
-Mãe, o que a senhora fez com minha
calça de estimação? __seus olhos lacrimejaram e começou a imaginar as possíveis
destinações dadas a peça por sua mãe. – Era presente, mãe.
Vanda virou o tronco levemente na
direção de onde Laura estava antes de continuar a falar.
-Daquela sua amiga de nome esquisito...
-Vladiscênia.
-Não quero nem saber o nome dos pais
dela. __a senhora sorriu.
-Minha calça, mãe. – Laura perguntou
impaciente.
-Joguei fora.
-Nãããooo... __quase gritou desesperada.
– A senhora não podia, mãe. Meu presente que ganhei com tanto carinho. Aquela
calça era meu xodó. Tinha era há três anos, dois meses e dez dias. Mãe cortei
relações com a senhora. __ já saia da sala quando ouviu sua mãe perguntar.
-Por causa de uma calça?
-Não era uma calça. Era A calça. A que
mais amo. __subiu as escadas e se trancou no quarto.
-Hum! __a senhora que havia parado
momentaneamente de assistir virou-se para sua TV.
Meia hora depois...
-Mãe, a senhora viu minha bermuda
saruel?
-Na máquina e já deve estar seca. __Laura
vai à máquina de lavar roupas e encontra a bermuda e a calça que sua mãe disse
ter jogado fora.
-MÃE! __ grita da área de serviço.
-O que foi agora?
-A senhora me enganou. Me fez acreditar
que havia jogado fora.
-Filha, se você visse suas expressões
entenderia. __a senhora ria.
-Pow, mãe. É sacanagem. __ foi para o
quarto com as calças na mão.
Depois diz que não gosta
de novela mexicana, mas faz um drama. –
Pensava a senhora enquanto começava a segunda novela da tarde também mexicana
Laços de Sangue.
-Mãe? - Laura chamava do quarto.
-O que é agora?
-Onde estão as correntes?
FIM
Comentários
Postar um comentário