Dvã de Todos os Santos - Capitulo IV



A Psicanálise surgiu em 1901, fundada pelo médico neurologista austríaco Sigmund Freud, e propõe uma nova visão de homem, não apenas contando com a lógica racional. Para Freud, a cura se dava pela fala, ou seja, seus pacientes verbalizavam as dores e sofrimentos e através de informações fornecidas pelos mesmos, o homem as diagnosticava. De acordo com seus estudos, questões inconscientes teriam o poder de influenciar ou gerar sintomas atuais. Através da psicoterapia, pode-se obter o autoconhecimento e resolução de conflitos internos que perduram atualmente através das tantas técnicas criadas por Freud e outros, influenciados pelos seus ensinamentos.
Quem os visse ali, sentados, provando um chá de erva doce em meio a uma conversa tipicamente rotineira, diria que são conhecidos de longa data ou pai e filha, talvez. Mas era o primeiro contato entre dois estranhos. De um lado, uma bela e inteligente mulher exercendo sua profissão, que lhe soava como vocação, haja visto que tinha se tornado extensão da moça. Do outro, um homem vivido, de feições cansadas, em busca de solução e equilíbrio para sua permanência no exercício de sua santa missão.


- O que o trouxe aqui, Antônio?

- Creio que terei de explicar-me desde o começo.

- Estou aqui para ouvi-lo.


O homem deixou a xicara em cima da mesa e passou a narrar sua tragédia. Contou-lhe sobre sua missão unindo os casais quando recorrem aos seus “serviços” e que de uns anos para cá, ocorriam situações estranhas e inusitadas. Disse-lhe também sobre a última união que ele abençoou e os infortúnios que sucederam.

O psicólogo deve sempre ter em mente a abstenção de julgamentos e a mínima emissão da sua opinião pessoal para que não influencie nos relatos e observações feitas pelo paciente. Muitos acreditam que é função do psicólogo retirar seu cliente dos problemas por ele enfrentado quando, na verdade, o terapeuta apenas o auxilia a ver certas situações com outros olhos, encontrando assim, seu caminho para o equilíbrio psicoemocional. Esse acompanhamento pode durar poucos meses ou levar anos, dependerá do desenrolar das consultas e da melhora do paciente.

Ao final da sessão, já havia data para retorno. Como ele era o último paciente, Eleonora deu seu dia por encerrado e para relaxar um pouco convidou sua assistente para um happy hour em um dos barzinhos que haviam próximos dali. Ao chegar em um dos bares da rua 2 de Julho, Eleonora avistou um dos seus colegas de profissão. O homem tentava a todo custo ter uma noite com ela. Quando pensava em sair do estabelecimento, sentiu uma mão suave em seu ombro.


-Léo? É você mesmo? - Uma ruiva sorria.

-Jasmine?! Jass… Nossa! Nunca mais nos vimos.


As mulheres abraçaram-se saudosas. Ambas eram da mesma turma na faculdade, tinham muitos amigos em comum e muitas vezes terminaram a noite emaranhadas nos lençóis da outra. Ambas eram amantes e apreciadoras das curvas femininas e não escondiam. Chegaram a competir, indiretamente, mas eram águas passadas. Após abraços e mais abraços, elas sorriram cumplices, e por um momento, a psicoterapeuta esqueceu-se da amiga que a acompanhava.

-Jass, essa é Luciana. Minha assistente e amiga nas horas vagas.

-Huumm! Amiga como nós já fomos um dia?

-Não! Apenas amiga. Sem segundas intenções.

-Bom saber! Quem sabe podemos relembrar alguns momentos.


Umedeceu os lábios em um meio sorriso que prometia muitas estripulias. Eleonora sorriu seu melhor e mais sacana sorriso. A noite parecia trazer-lhe boas surpresas e pretendia aproveitar todas, de preferência entre lençóis. Os da sua cama ou os da ruiva. Seguiram para uma mesa em meio a conversas descontraídas e flertes. Luciana não se demorou muito com as mulheres alegando cansaço.

Eleonora a levou até a entrada do Garcia, bairro onde a moça morava. De lá seguiu para o bairro da Federação. Morava a duas quadras de distância da rádio transamérica e achava aquele lugar tranquilo. O edifício onde residia tinha um sistema avançado de vigilância e as vizinhas também faziam o registro de quem entrava e saia.

Parou o carro em sua vaga descendo para abrir a porta do carona em um gesto de cavalheirismo. A ruiva sorriu da reverência teatral e seguiram de mãos dadas para o interior do prédio.


Mulher é um bicho bem estranho e complicado.
Demora pra gostar, mas quando gosta fica indecisa.
Não sabe se vai direto ao assunto
Ou se espera e fica no muro.
E quando vem outra querendo entrar na disputa
Fica brava, fecha a cara e nem Deus consegue convencer de que a outra não tem culpa.

Versos de uma Nordestina

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