Nossa Forma de Amar - Capitulo III


3 – A Filha do Pastor


Luiza estava lendo um livro ou pelo menos tentando, pois seu pensamento estava em certa morena. Decidiu então ligar para ela na esperança de ouvir sua voz. Discou e esperou. No décimo toque desligou. 

Será que ela não quer me atender? Talvez ela esteja ocupada ou dormindo. - quando encerrou a ligação ouviu batidas na porta. Autorizou a pessoa a entrar.


-Filha, podemos conversar?
-sim, papai.
-Você sabe que eu e sua mãe queremos o seu bem e também temos a igreja. Queremos que você de continuidade as obras do Senhor tanto nos deveres de filha como nos de serva. Eu faço muito gosto no seu casamento com o Moisés, pois ele é um rapaz trabalhador, servo do Senhor. Ajudou-me esse tempo todo sem pedi nada em troca.
-o senhor conhece a família desse rapaz? Sua historia? Seu passado?
-ele veio de uma cidade interiorana, seus pais já são falecidos e eu e sua mãe o acolhemos aqui. O passado dele não importa se ele é obediente às leis de Deus.
-hoje as coisas não funcionam mais assim, meu pai. Temos de conhecer muito bem uma pessoa antes de coloca-la em nossa casa. E não vou me casar com Moises.
-você é minha filha e vai fazer o que eu achar melhor pra você. Já bastou essa ideia de ir estudar fora, fazer faculdade. Não sei como é que você irá usar isso aqui em casa. Pra ser boa esposa não precisa disso. Veja sua mãe.
-quem disse ao senhor que eu tenho pretensão de casar? Se o senhor quer que sua igreja prospere é só tomar conta dela, mas me casar para um propósito seu não.
-você ainda vai me dar razão. Agora vou deixar descansar. Boa noite Luiza.


Luiza ficou pensando se já não estaria na hora de ir para uma casa só sua. Emprego já tinha, poderia se manter tranquilamente com seu salário, não precisaria dar satisfações de sua vida tampouco ter interferências em suas escolhas. No dia seguinte começaria a procurar um apartamento pelo bairro mesmo e tentaria falar com Milena.

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Quando Maria e José casaram-se por intermédio das famílias, construíram um casebre no terreno doado pelos pais de Maria em uma cidade interiorana. Aos sábados, o casal frequentava uma igreja evangélica. Certa noite, o José foi convidado a ministrar junto com o pastor um culto.

Os fieis impressionaram-se com a forma com a qual José discursava sobre A Palavra. Ele tinha o dom da oratória. Ficou acordado assim que se por alguma eventualidade o pastor não pudesse comparecer ele seria seu substituto.

Alguns anos depois, o antigo pastor com a idade avançada e doente passou o controle total da sua igreja para o irmão José, tornando-o assim o novo pastor. Desde então a igreja prosperou devido ao aumento dos fieis. A antiga casa pequena do casal tornou-se um casarão entre tantas outras conquistas que tiveram.

Maria sempre almejou um filho para sacramentar seu casamento. E engravidou, porém quando estava no sétimo mês de gravidez o ônibus no qual ela estava sofreu um acidente e ela tomou um susto tão grande que ocorreu um pequeno sangramento. Ela foi levada para o hospital às pressas e graças aos médicos e intervenção divina não perdeu seu bebe. Foi aconselhado então pelo obstetra da cidade que eles se mudassem para a capital para um melhor acompanhamento da gravidez.
Como já tinha uns parentes na capital, logo o casal se adaptou e procuraram uma igreja da mesma congregação. Devido aos congressos, os pastores se conheciam e a comunidade os acolheu de braços abertos.

Dois meses depois, nascia a princesinha dos olhos do pastor. Sua pequena Luiza. No final do parto houve complicações e devido a uma hemorragia, Maria não poderia mais ter filhos. Por um lado o José ficou triste, pois não teria o filho varão para perpetuar o sobrenome da família, mas viu na sua princesa um futuro promissor.

Luiza cresceu sendo criada dentro dos mandamentos da igreja e por ser filha do pastor sempre era apontada como exemplo a ser seguido. Desde pequena, a menina sentia-se sufocada. Sem amigos, filha única e cobrada como gente grande. Não teve a infância sadia, época de fazer amizades e brincar.

Aos 14 anos Luiza foi obrigada a trocar de colégio, seus pais não o consideravam um bom colégio para esta nova fase de sua vida. Afastada dos amigos que a muito custo conseguiu cultivar, Luiza se via sozinha novamente em um lugar desconhecido onde passaria os próximos três anos estudando.

No primeiro dia de aula seus pais a levaram, conversaram com a diretora fazendo mil recomendações. A partir do segundo dia quem a levaria seria o motorista da família. Seus colegas de turma tentavam provoca-la dando apelidos entre eles o de Maria caipira, jeca e o que mais a chateava patinho feio.

No segundo ano, Luiza percebeu que seus colegas sempre estavam de namoricos ou paquerando uns aos outros, mas ela pouco se interessava por isso. Pensava apenas em estudar para sair logo daquele lugar. No segundo semestre deste mesmo ano, a professora de literatura do colégio pediu licença alegando problemas pessoais. Uma substituta foi providenciada.
Neste dia Luiza havia atrasado um pouco e quando chegou a professora nova já estava sendo apresentada a classe. Ivana era seu nome. Nada alem da professora e dela existiam naquele momento. Os olhos azuis turquesa a hipnotizaram de tal forma que uma colega lhe fez uma pergunta e ela demorou-se na resposta.

Aos poucos, a jovem foi descobrindo o sentimento de admiração que sentia por aquela mulher. Porem este sentimento foi tomando proporções que ela desconhecia. Sentiu medo e não sabia em quem confiar e desabafar.

Seu único confidente era um diário. Para ele contava o que de bom e ruim lhe acontecia. Os olhares para a professora e da professora para si. Escrevia também seus dilemas ao ouvir na escola dominical que Deus tinha feito o homem para a mulher e vice versa. Todo e qualquer tipo de relação que fugisse a regra estaria indo contra os desígnios de Deus. Tudo isto a confundia e preferia guardar para si.

No fim do ano letivo sempre acontecia uma pequena confraternização. Neste ano alem do termino de mais uma jornada também era despedida de Ivana, tinha recebido uma proposta para fazer seu mestrado em outro estado e aceitara. Nada a prendia na cidade. Na hora do inevitável adeus, foi-se formada uma fila para dar-lhe os cumprimentos.

Luiza observava ao longe, atrás de uma das inúmeras arvores do jardim iluminado pelas luzes de natal. Sentou-se no banco e ficou a admirar o luar e indagar-lhe por que aquele sentimento de vazio envolvia seu coração. Estava tão absorta que não sentiu uma aproximação sutil que parou a poucos passos e ficou a observa-la.


-não vai despedir-se de mim?


Luiza não precisaria virar para saber de quem se tratava. Seu coração disparava no peito como se quisesse saltar. Respirou fundo e levantou-se olhando diretamente nos olhos da sua tão admirada professora antes de responder tentando aparentar toda calma possível.


-iria sim, só estava esperando a fila acabar. – e deu um sorriso arteiro de quem foi pega em flagrante e tentava escapar com uma desculpa esfarrapada.
-a fila já acabou. – sorriu a professora. Esta menina pensava que a enganava.


Aproximaram-se e um abraço foi o suficiente para que a jovem tivesse a impressão de ter chegado ao paraíso. Permaneceram por minutos incontáveis. Quando se separaram Ivana alisou o rosto da pequena jovem depositando um beijo perto do canto dos lábios. Dizendo em seu ouvido que jamais a esqueceria. Enquanto Ivana caminhava em direção ao taxi com seu requebrado nos quadris, Luiza via sua musa ir embora. Nessa noite seu diário conheceu as primeiras lagrimas derramadas por um amor proibido e que ela julgava impossível. O tempo se encarregaria de cicatrizar aquele doce coração.

Seus pais, ou melhor, seu pai já tentava arranjar um casamento para a filha. Seus amigos/irmãos de congregação apresentavam seus filhos em encontros e retiros para que os jovens interagissem e quem sabe ela se interessasse por alguém. Enquanto deixava seu pai pensar que seu destino já estaria traçado, Luiza planejava sair daquele lugar.

Inscreveu-se em alguns vestibulares de universidades tidas como as melhores. Aproveitou um dinheiro que juntava e em um fim de semana viajou e fez a prova tão concorrida. O resultado saiu um mês depois. Aprovada entre as melhores notas, na mesma semana completaria 18 anos. A questão seria convencer seu pai a deixa-la ir estudar fora. Enquanto isso arrumou toda a documentação, matriculou-se e já havia encontrado um pensionato de moças para hospedar-se. Já havia pensado na possibilidade de seus pais não querer sustenta-la, procuraria um emprego que desse para custear suas despesas.

Quando soube dos planos de sua filha, José ficou indignado. Jamais filha sua sairia de baixo das suas asas para ir tão longe, São Paulo. Ficaram dias sem se falar. Maria não aguentando mais a agonia que se instalara naquela casa e o dia da partida da filha se aproximando tentou de todos os jeitos dobrar o marido, mas foi em vão. Em um dia ensolarado Luiza partia rumo a uma nova fase de sua vida. Em breve conheceria o mundo com outros olhos.

Comentários

  1. Luiza moça de coragem ... Gostei dela
    Acho que ela terá muitos problemas com esse pai 😑

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