Nossa Forma de Amar - Capitulo V
5 - Precisamos Conversar
A festa surpresa encerrou-se por volta
das 1 hora da manhã. Milena ao despertar do transe estava exausta. Seu desejo
era um banho e cama, mas havia visitas e teria que recepciona-las. Após mais ou
menos 1 hora entre conversas amenas, sorrisos e promessas de visitações
despediram-se das donas da casa.
-dona Lucimara! Sempre aprontando.
Como conseguiu reunir esse povo todo aqui?
-telefone, oras. – deu um sorriso
sacana.
-ta certa! Mereci essa. Como Simone
ficou sabendo?
-Essa é uma historia longa. Vá para
seu banho, descanse e amanhã contarei sobre ela.
-mais tarde, a senhora quer dizer. Boa
noite mãe. – despediu-se depositando um beijo em sua bochecha.
Chegou ao quarto já retirando suas
roupas e entrando no banheiro. Após uma ducha em temperatura morna já poderia
dormir sossegada. Ao olhar a mesa onde seu celular estava repousado, o viu
piscando. Conferindo-o notou que havia algumas chamadas perdidas do numero de
Luiza. Retornaria assim que acordasse.
O dia amanheceu chuvoso. Milena abria
os olhos tentando focalizar algo no teto de seu quarto. De repente como se
tivesse levado um susto procurou seu celular. 10:37.
Nossa! Dormi demais. O que ela estará fazendo?
É Lena. Só ligando para saber.
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Luiza havia depois de muito custo
conseguido pegar no sono. O tempo em que ficou acordada pensava inúmeras razões
para que Milena não atendesse o bendito celular. Que ela estivesse dormindo foi
a mais obvia. Poderia ter esquecido o celular no silencioso, como a própria
sempre acabava fazendo. Poderia estar com familiares e amigos. Ate em uma
possível namorada pensou, decidindo deixar essa hipótese de lado.
Ela não seria tão baixa flertando comigo tendo
outra. Ou seria?! Deixa de besteira, Lulu. Bom, ligar você já ligou. Se ela
tiver interesse terá que ligar. É. Isso aí! Se faça de difícil. – pensou e sorriu.
Olhou o relógio eram 7:40.
Fez sua higiene matinal e foi a procura dos pais pela casa. Encontrou um
bilhete informando que eles haviam ido para a igreja, o café estava pronto e
tentariam voltar para o almoço, mas caso não conseguissem tinha empadão no
forno.
Comeu uma goiaba, sua fruta preferida
e voltou para o quarto. Olhou em sua prateleira algum livro que ainda não tenha
lido e escolheu A Batalha do Apocalipse –
Eduardo Spohr. Inevitavelmente sorriu. Em breve sua vida carregaria esse
titulo se as situações se encaminhassem como pareciam.
Sentou-se em sua cama e olhou mais uma
vez a paisagem da janela de seu quarto, no segundo andar. Chuva. E das fortes. É Salvador. Hoje vou ficar entre lençóis. Antes
de terminar de ler o titulo do prólogo a voz de Laura Pausini e seu italiano
melodioso começou a soar pelo quarto obrigando-a a sair da cama. Quando olhou o
visor um sorriso instalou-se em seu rosto. Respirou fundo antes de atender.
-Alo!
--Bom dia, minha flor. – disse Lena
com sorriso na voz.
-Melhor agora que me ligaste. – sorriu
zombeteira.
-Nossa! Isso foi uma cantada?
-Jamais! É apenas minha constatação a
cerca do quadro de saúde da pessoa que vos fala.
-Para quem ontem estava meio tímida,
hoje esta toda saidinha. – gargalhava.
-Fazer o que?! Aprendi com você.
Liguei ontem pra ti,mas deu caixa postal.
-Pois é. Só vi quando acabou uma festa
surpresa que minha mãe fez pra mim. – omitiu o tipo de festa. – mas diga o que
desejas de mim?
-te ver. Conversar contigo.
-Hum. Também preciso lhe falar. Mas
essa chuva que não arreda também não ajuda muito.
-É. Vamos fazer assim, se a tarde o
tempo estiar, a gente marca um local.
-Esta combinado. Então ate à tarde
minha flor.
-Até a tarde, anjo.
Ambas sorriam e agora rezavam para que
esta chuva parasse o mais breve possível. Luiza voltou sua concentração para a
leitura de seu livro. Vez ou outra olhava as horas e a janela lá fora. Duas
horas depois seu estomago deu sinal de vida. Quando esquentava seu almoço seus
pais chegaram trazendo Moises.
-Filha, olha quem trouxemos para
almoçar.
-Oi. – Luiza disse de forma seca já
prevendo que esse almoço seria indigesto. Seu pai queria a obriga-la a casar
com este rapaz, mas algo dentro dela dizia que ele não era confiável.
-Sente-se Irmão, vou servi-lo. – disse
Maria.
Luiza alegou qualquer desculpa e foi
almoçar no quarto contrariando seu pai. – Ela irá te aceitar irmão. Persevere
em nosso Senhor, irmão.
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Após falar com sua pretensa
pretendente, pelo menos de sua parte, Milena levantou-se e tomou um banho
demorado. Saiu pela casa a procura da mãe, da irmã ou de qualquer alma viva.
Encontrou uma reunião de comadres na cozinha enquanto preparavam o almoço
resenhavam a festa do dia anterior.
-Mas mulher, pelo amor de quem matou
Maria Helena. Que roupa era aquela? Parece que pegou aquelas toalhas de mesa do
tempo de minha avó e moldou no corpo. – Luca, Luis Carlos para os desconhecidos
faziam todos da cozinha gargalhar com suas tiradas.
-Aí Luca, se a mãe pega você falando
isso vai ver com quantos cipós caboclos se toma uma surra. – disse Dalila.
-Ela não vai saber a menos que alguém
fale.
Milena ria lembrando-se de como Luca
havia chegado à casa anos atrás.
Milena e sua mãe estavam chegando de mais um
dia de feira quando ouviram vozes alteradas vindas do portão principal. Saíram
para ver o que acontecia. Dois filhos da casa tentavam conter aquele rapaz
aparentemente perturbado. Vestido em farrapos, sem qualquer resquício de
higiene tentava a todo custo entrar e era rechaçado pelos homens.
-Deixem eu entrar. Eu preciso falar com ela.
Só ela pode me ajudar. Deixem eu entrar. – era apenas isso que aquele jovem
gritava.
Lucimara aproximou-se do portão e tocou no
ombro dos rapazes. Afastaram o caminho para ela passar. O jovem postou-se de
joelhos, já sem forças, chorando e implorando para que ela a ajudasse. Devido à
desidratação e desnutrição ele desmaiou. Os rapazes o levaram para o barracão e
o deitaram no banco. Uma jovem trouxe um copo de suco e um pedaço de bolo, ao
qual ele devorou assim que acordou. Após ele começou a contar sua historia.
-eu sempre tive tudo que quis. Sou de família
rica. Mas perdi tudo quando meus pais souberam que eu era gay. Expulsaram-me de
casa. Fui morar com a senhora que me criou. Ela me ajudou a conseguir um
emprego. Minha vida ia bem até eu me apaixonar por um colega de trabalho. Ele
dizia para todos que era hétero, que jamais se envolveria com uma “bichinha”
para todos, mas quando ficava só nós dois pra fechar o mercado. Era ele que
dava em cima de mim. Vivia me espreitando. De tanto ele insistir, eu cedi.
Começamos a ter um caso. Ele era noivo e a mulher descobriu. Procurou uma
dessas casas que as pessoas fazem amarrações e fez. Uma para prender ele e
outra para me destruir. Do nada eu fui demitido, fui perdendo tudo que
conquistei com esforço de uma vez. Ate ir parar nas ruas, vivendo como mendigo.
Quando passava por uma dessas ruas a noite, um papel veio voando e bateu no meu
rosto. Quando li era um pedaço de reportagem falando da sua casa. Nunca gostei
de candomblé, era uma pessoa preconceituosa com isso. Pra mim era tudo macumba
e só servia para o mal. Mas engolir meu preconceito e vim implorar sua
ajuda. Se a senhora não puder, ninguém
mais poderá. – ao fim do relato, ele chorava.
-qual o seu nome?
-Luis Carlos.
-Luis, existem pessoas que fazem o mal,mas eu
só faço o bem. E vou te ajudar.
Lucimara o alojou em um quartinho no sitio.
Deu-lhe banho, aparou os cabelos e a barba, fez as unhas e comprou roupas do
seu tamanho. Agora sim, apresentável. Lucimara o levou até o quarto onde
colocava consulta para seus clientes. Os búzios determinaram tudo que deveria
ser feito para a recuperação de Luca. Em menos de três meses ele conseguiu
emprego e aos poucos se reerguia. Nesse meio tempo ele aprendia cada vez mais
sobre o candomblé e aos poucos desmistificava a visão deturpada que tinha.
-Que feira é essa aqui? – perguntava
Milena rindo das caras de susto. Já recuperado Luca fez sua habitual piada.
-Acordou a bela adormecida! Então
mona, como andam os ventos de Sampa?
-São brisas. Estão calmos.
-E as amapôs?
-Não deixei nenhuma lá.
-E as daqui? Sua ex, a caninana estava
aí ontem. Alias desde que você viajou ela começou a cercar a mãe com um papinho
de documentário pra divulgação da associação. Cerca Lourenço. No fundo era pra
ter alguma noticia sua e pelo jeito que ela babou quando te viu entrar a mona
ali tem um tombo por ti.
-só que eu não a quero mais.
-Tem mona nova na parada. – Luca
sorriu.
-Eu nego. – Milena sorriu enquanto
servia seu café e olhava o tempo. Enquanto isso, a feira continuava nos
preparativos do almoço. Com um ou outro comentário feito por ela.
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