Nossa Forma de Amar - Capitulo LI (Penultimo)


51 – O Último Adeus

Dona Cila – Maria Gadú


-Algo que envolve nosso futuro. – Milena sentou ao seu lado segurando em sua mão.
-Algo grave? Você quer terminar? É isso? – os olhos marejaram.
-Não. Jamais. – Milena enxuga a lágrima solitária. – Mas não sei se você não terminará comigo após essa conversa.
-Fala amor. – Luiza viu sua anja respirar fundo antes de começar.
-Minha mãe chamou a mim e minha irmã logo que chegamos. Deu-nos os cadernos de anotação da vovó e pediu que lêssemos. Depois passou a nos delegar maiores responsabilidades. – respirou fundo enxugando uma lagrima. – no começo eu achei que fosse apenas por sermos herdeiras e sucessoras naturais, mas depois do dia em que ela teve o infarto penso que ela fez de caso pensado.
-Isso quer dizer que?
-Que em breve serei uma Iyalorixa. A zeladora do terreiro no qual estamos. E quando começamos a namorar eu era só a filha da mãe de santo. Em pouco tempo eu serei a mãe de santo. Você quer continuar ao meu lado mesmo que vá contra as opiniões alheias?
-Claro que sim, meu anjo. Apaixonei-me pela Milena não pela mãe de santo. Você continuará sendo a minha Milena. – selou seus lábios em um leve roçar que evoluiu para um beijo intenso, mas pararam por ali antes que ambas esquecessem que precisavam visitar seus respectivos pais.


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Simone chegava a casa depois de ir cobrir a virada cultural paulista cansada e desejava apenas banho e cama. Assim que fechou a porta sentiu um doce perfume no ar e o reconheceria em meio a multidões.

Seguiu na direção do cheiro e teve uma bela visão. Uma morena de curvas espanholas preparando algo no fogão enquanto cantarolava I Turn To You da Christina Aguilera. A outra estava distraída enquanto a jornalista se aproximava agarrando em sua cintura e dando um beijo em seu pescoço desnudo.

Rúbia reconheceu aquele toque e virou-se no abraço recebendo um beijo repleto de saudade. Depois de longos minutos conseguiram soltarem-se. A espanhola fez com que a outra fosse para o banho antes que começasse a destampar as panelas. Simone foi para sua ducha quente. Enquanto deixava a água escorrer no corpo pensava no quanto sua vida havia mudado.

Depois de tanto chorar expurgando toda a dor que lhe afligia saiu pela casa a procura de Rúbia. Não a encontrou em canto algum. Sentou-se pensando que havia sido abandonada justo no momento em que estava fragilizada.

Abraçou os joelhos e chorava em um canto escuro da sala quando ouviu o barulho de chaves girando na porta. Rúbia ao abrir a porta se deparou com uma cena que cortou seu coração. A repórter era a criatura mais frágil do mundo em sua visão. Deixou sua bolsa e a chave no aparador e sentou ao lado da jovem abraçando-a. sentiu as mãos pequenas apertá-la e entre fungadas o pedido.

-Por favor, não me deixe.
-No farei isto. – retribuiu o abraço na mesma intensidade.

Passado um tempo conseguiu tirar a moça do chão e pediram pizza. Simone pediu que a outra dormisse em seu quarto só aquela noite. Aquela noite transformou-se em semanas. Rúbia tinha algumas palestras a dar pelo Brasil e alguns países internacionais e quando tinha folga visitava seus pais rapidamente passando dois ou três dias e voltava a capital baiana para ver Simone. Em uma dessas visitas pensava na mudança de sua vida e por onde andaria seu mentor que a certo tempo não aparecia.

“-Estou aqui, minha cara. – Augusto soprou em seu ouvido. – E devo confessar que vem cumprindo sua missão com louvor.
-Mas não a convenci a dar uma nova chance aos pais.
-Não se preocupe criança. O coração dela não é mais o mesmo, assim como o seu.
-Não entendo aonde quer chegar. – Ela sabia.
-Apaixonaste. Encontrou seu porto, minha criança. Deixou de dar importância ao prazer carnal em prol do prazer da alma. Nos pequenos momentos e sorrisos. Minha criança cresceu.
-Você sabia. – Rúbia disse em tom afirmativo.
-Suspeitava. Agora vou deixá-la descansar.”


Assim que abriu a porta do apartamento com a chave reserva que havia ganhado da sua baixinha se deparou com velas aromáticas dispostas por todo apartamento. Simone a aguardava na varanda com duas taças de vinho e ao vê-la sorriu.

Encontraram-se em meio à sala e Rúbia aceitou a taça. O jantar foi regado a boa música, sorrisos, toques sutis e olhares. Ao fim, Simone a convidou para uma dança e entre sussurros e risadas a dança se fez. Depois de respirar Simone olhou nos olhos espanhóis e disse-lhe o que vinha em seu coração.

-Morena confesso que meu interesse inicial em você foi pelas curvas do seu corpo. – ambas sorriram. – Mas então conheci um lado seu e deixei que conhecesse minha historia, minhas fragilidades. Você foi a pessoa que pude contar desinteressadamente e não sei como ou em qual momento, mas me encantei por ti. Esse encanto virou bem querer, depois paixão e hoje sinto que não posso viver sem ti. Quando viajas e demora mais que o previsto sinto sua falta, conto os minutos e tantas outras coisas que apaixonados fazem. – bufou enxugando uma lagrima. – há tempos atrás pensei amar Milena, mas hoje vejo que era apenas atração. E vou parar de enrolar. Rúbia Garcez, você aceita ser minha namorada?


Os olhos de Rúbia marejavam depois de tão linda declaração e sua resposta já se sabia antes mesmo da pergunta. A morena beijou-a por todo o rosto enquanto sorria feliz dando a resposta.

-Sí, cariño. Aceito ser tu namorada.

Beijaram-se leve a principio depois evoluindo para um beijo desejoso. As mãos passeavam pelos corpos desvendando, revelando cores e texturas. Nada escapava aos sentidos. Simone deitou sua morena na cama enquanto retirava o vestido da outra a deixando apenas de lingerie.

Olhou aquele corpo delicado. Tirou seu vestido e colou os corpos. Uma descarga elétrica os percorreu. As bocas voltaram a encontrarem-se. Beijos, mordidas, lambidas. Era tudo valido, tudo permitido. As mãos escorregaram pelas intimidades pulsantes e molhadas.

Olhos nos olhos enquanto se penetravam e consumavam um ato de amor. Não era apenas uma transa, não era sexo puro e simples. Era o amor em sua forma mais pura para os amantes. Era divino.

Quando chegava à cozinha ouviu no noticiário a historia do homem que invadiu o apartamento de uma família evangélica e ficou chocada ao ver quem eram os donos do lugar. Esse mundo era mesmo pequeno. Mas não pensaria sobre isso, uma morena hermosa a esperava para almoçar.


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Dalila aguardava a chegada da irmã para poder entrar no quarto. A mãe havia mandado chamar as duas. Assim que Milena chegou entraram no quarto fazendo pouco barulho.


-Mãe. – Dalila chamou.
-Oi... princesa... – a mulher lentamente sorriu. – Vocês... vieram...
-Claro, mãe. Não se esforce.
-Eu... preciso... cheguem. – a mulher pegou as mãos das filhas com cuidado dizendo. – vocês foram... meu maior... tesouro... cuidem bem... dos seus... irmãos.
-Não, mãe. Quem irá cuidar é a senhora.
-Não... tem... tempo... – a mulher falava com dificuldade chegando a pausas de cinco minutos para respirar. –Sejam... unidas... mãe... ama... vocês.
-Nós também te amamos. – Responderam as duas em prantos.

Lucimara sorriu e beijou as mãos de suas filhas. Via sua avó em pé ao lado de Rômulo na porta. Ambos sorriam. Hora de descansar. Seus olhos se fecharam para sempre. Nascia no céu mais uma estrela. Os médicos tentaram reanimá-la sem sucesso algumas vezes até constatar o obvio. Lucimara Ventura havia encerrado sua missão na terra.

Dalila correu para fora do hospital o mais rápido que conseguiu. Não era afeito aquele lugar e perder sua mãe havia devastado-a. escorou-se em uma das pilastras laterais chorando quando sentiu alguém parar ao seu lado. Pensou ser algum familiar, mas ao levantar a cabeça viu um rapaz.

De aproximadamente 1,70 metros. Negro, porte atlético e vestia roupas brancas. O rapaz perguntou o que a fazia chorar e ela sem entender direito contou-lhe da perda de sua mãe. Desinteressadamente ele se ofereceu para ajudá-la. Aos poucos uma amizade iniciava-se. O rapaz era professor de História e apaixonado pelas religiões de matriz africana. Seu nome? Harley.

Os tramites do enterro foram resolvidos por Milena já que Dalila não tinha condições. Os filhos se reuniram no terreiro e de lá seguiram para a capela do Cemitério Campo Santo onde seria velado e enterrado. Por ser uma iyalorixa o cerimonial foi cheio de cânticos e orixás dando seu ile. A perda de sua mãe lhes era sentida.

O dia estava nublado e após o enterro Luiza parou em um bar com Milena. Pediram uma cerveja e beberam em silencio. Seguiram para a casa de Milena e foi à vez de Luiza cuidar dela. A apatia da moça era normal devido aos acontecimentos. Os dias passaram lentamente. Dalila não suportou ficar naquela casa cheia de lembranças e ficou na casa da irmã. Aos poucos as jovens aprendiam a viver.

Quase um mês depois do sepultamento de Lucimara, o pai de Luiza recebeu alta e se mudaram para um apartamento reformado. Mas o AVC deixou sequelas visíveis no pastor, ele não andava mais sem ajuda de uma bengala e sua fala ficou arrastada.

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